O subfinanciamento e a má-gestão do Sistema Único de Saúde são os principais problemas apontados por especialistas ouvidos pela CBN. Ouça a primeira reportagem especial sobre os 30 anos do SUS, marcados por avanços e contradições.
‘Eu tô com problema na coluna, tô na fila no Paranoá há mais de três anos, tem cinco mil pessoas na minha frente. Ou seja, não vou conseguir a consulta jamais’.
Esse é o relato de Elisabeth, de 53 anos, dona de casa.
Mas há outros tipos de experiência com a mesma estrutura comandada pelo governo:
‘Eu precisei fazer um transplante de fígado. Dia 17 fez três anos que eu fui transplantada. Se eu não tivesse condições de fazer pelo SUS seria muito difícil, porque é uma cirurgia caríssima, mais de R$ 100 mil’, diz a secretária Margarida, de 60 anos.
Duas faces de um mesmo sistema: o SUS, que completa 30 anos.
Elisabeth é vítima de um dos maiores problemas do Sistema Único de Saúde no Brasil: as imensas filas de espera. ‘Já dei o caso como perdido. Pode olhar aí quantas pessoas têm, esperando horas e horas e, atendimento, nada’, critica.
Já Margarida foi beneficiada por uma das principais virtudes do SUS, o modelo de transplante de órgãos, onde 90% das cirurgias no Brasil são feitas na rede pública. Contradições que marcam o maior sistema de saúde gratuito do mundo, reconhecimento da Organização Mundial da Saúde. ‘O transplantado tem que usar os imunossupressores que eu também retiro na rede pública, e é pelo SUS. Não posso me queixar de nada, nunca me faltou o medicamento’, afirma.
O SUS foi criado juntamente com a Constituição de 1988. De lá pra cá, o Brasil garantiu acesso gratuito a todas as vacinas recomendadas pela OMS. E também a assistência integral e de graça para pessoas com HIV, pacientes renais crônicos, com câncer, tuberculose e hanseníase. Além disso, expandiu a atenção primária, o que reduziu as mortes infantis, doenças cardiovasculares e infecciosas.
Hoje, sete em cada dez brasileiros dependem exclusivamente do sistema público de saúde – mais de 150 milhões de pessoas. Avanços de um sistema que, nem sempre se mostra eficiente, diz a coordenadora do programa de gestão em saúde da Fundação Getúlio Vargas, Ana Maria Malik:
‘O brasileiro tá muito mais bem servido do que estava 30 anos atrás. Extinguir o SUS é um atentado. O SUS é um direito que a população brasileira conseguiu e não vai abrir mão.’
União, Estados e municípios investem, por ano, cerca de R$ 240 bilhões no sistema público de saúde. Dados da OMS mostram que o investimento do Brasil é de 6,8% do orçamento, quase a metade da média mundial, que é de 11,7%.
Além da questão orçamentária, um estudo do Banco Mundial constatou que a ineficiência de parte do SUS é fruto, principalmente, da má-gestão e falta de planejamento. Por ano, são 22 bilhões de reais que vão pelo ralo. Dinheiro público que poderia ser investido para melhorar o atendimento, ressalta o economista Edson Araújo, responsável pela área de saúde do Banco Mundial:
‘O principal fato de ineficiência é o número de hospitais pequenos no Brasil. Aproximadamente 80% dos hospitais têm até 100 leitos. São altamente ineficientes, alto custo fixo e produzem poucos serviços’, alega.
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CBN
POR RODRIGO SERPA
(rodrigo.serpa@cbn.com.br)
Atendimento pelo Sistema Único de Saúde.
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil